Patogénese

 O evento inicial no tétano é o trauma para o tecido hospedeiro, seguido pela contaminação acidental da ferida com C tetani. A contaminação de feridas com esporos da C tetani é, provavelmente, a ocorrência mais frequente. Quando o crescimento da bactéria é iniciado, o próprio organismo não é invasivo e permanece confinado ao tecido necrótico, onde as células vegetativas de C tetani elaboram a toxina letal. O período de incubação do aparecimento do ferimento para o aparecimento dos sintomas varia de poucos dias a várias semanas, dependendo da dose infectante e do local da ferida (quanto mais periférico o ferimento, maior o tempo de incubação). C tetani não provoca por si só inflamação e o portal de entrada (ferida) mantém uma aparência benigna a não ser que outros organismos estejam presentes na infecção.

 

C tetani produz duas toxinas: tetanolisina, uma hemolisina que é inactivada pelo colesterol e tetanospasmina, uma toxina espasmogénica responsável pelos sintomas clássicos da doença. As acções da tetanospasmina são complexas e envolvem três componentes do sistema nervoso: o controlo do motor central, a função autónoma, e a junção neuromuscular.

 

A toxina libertada na ferida pode espalhar-se pela corrente sanguínea, sistema linfático ou sistema nervoso. Se alcança o sistema nervoso liga os terminais dos neurónios motores periféricos à ferida, entre os axónios, principalmente através de junções neuromusculares de neurónios motores alfa e é transportada para o corpo das células nervosas, no tronco encefálico e medula espinal por transporte intraneuronal retrógrado (este transporte retrógrado para o SNC é semelhante ao utilizado por alguns vírus como o vírus do herpes e raiva). Depois, a toxina migra através da sinapse para os terminais pré-sinápticos (não ficando acessível para ser neutralizada pela antitoxina), onde bloqueia a libertação de neurotransmissores inibitórios: glicina (um dos 20 aminoácidos standard) e ácido aminobutírico (GABA – obtido a partir de um dos 20 aminoácidos standard, o glutamato).

O bloqueio da libertação dos neurotransmissores pela tetanospamina, uma zinco metaloprotease (protease que funciona com o ião metálico zinco no mecanismo catalítico), envolve a clivagem de proteína(s) fundamenta(is) para o mecanismo de fusão e libertação correcto da vesícula sináptica (proteínas SNARE e SNAP-25).Como não há exocitose dos neurotransmissores inibitórios, a entrada de cloro e a saída de potássio é afectada, promovendo um equílibrio mais positivo fazendo com que um mínimo estímulo provoque a despolarização. Esta despolarização estimula os músculos antagonistas e agonistas produzindo os espasmos. A perda de inibição da acção dos neurotransmissores inibitórios pode afectar, também, os neurónios simpáticos pré-ganglionares na matéria cinzenta lateral da medula espinal e produzir hiperactividade simpática e níveis plasmáticos elevados de catecolamina (da família da adrenalina) em circulação. A tetanospamina, tal como a toxina do botulismo, pode bloquear a libertação de neurotransmissores nas junções neuromusculares e originar paralesia ou fraqueza, já que a libertação de acetilcolina dá-se de uma forma defeituosa; a recuperação exige surgimento de novas terminações nervosas. Tetanospasmina pode ser tão potente como a toxina de C botulinum. A causa final da morte é geralmente insuficiência pulmonar ou cardíaca.